sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A EPÍSTOLA DE TIAGO

INTRODUÇÃO

A carta de Tiago é situada por Brown entre as epístolas católicas, que embora tenha sido refutada por Lutero, é considerada, em nosso tempo, como escrito de maior consciência social do Novo Testamento. Koninjes e Krull o tratam como uma coleção de pensamentos tirados da pregação do apóstolo, ou ainda, de uma coletânea de conselhos e advertências, encadeada de modo a facilitar a memorização.
O espírito que emana da carta é que a existência cristã é um tempo de provação para testar nossa fidelidade àquilo que recebemos de Jesus, o que concretamente significa cuidar dos desprotegidos, órfãos, viúvas; não discriminar os humildes; não dominar a comunidade pela língua; nem dividi-la de outra maneira; cuidar dos enfermos e pecadores. “E de modo especial, para os ricos na comunidade, não se deixar endurecer pela ganância” (KONINJES e KRULL. pg 23).
Partindo do texto de Carrez, é possível afirmar que o escrito de Tiago se apresenta como uma carta: traz endereço característico, o nome do expedidor e quem são os destinatários. Kümmell, Koninjes e Krull, e Brown também consideram que Tiago, em seu conjunto, dá a impressão de ser um ensaio redigido sob a forma de epístola ou carta. O primeiro deles, porém, considera que os leitores não podem ser nitidamente definidos.
Na perspectiva de Carrez, por terminar de forma abrupta, o texto dá a impressão de inacabado. Ele não revela a existência de uma relação pessoal entre o remetente e os destinatários. Tampouco nos permite situá-lo no tempo e no espaço, mas apenas que sejam levantadas respostas hipotéticas.
Devido à presença marcante de passagens que nos remetem ao Antigo Testamento, como citações de Abraão (2,21-23), da prostituta Raab (2,25), do profeta Elias (5,17), entre algumas outras, Carrez afirma que certos estudiosos chegaram a considerar este livro como um escrito não apostólico, ou ainda um escrito judaico atribuído ao patriarca Jacó e dirigido às doze tribos. Quanto à estruturação do texto, apresenta-se aparentemente como uma série desordenada de exortações (morais) gerais, sem uma reflexão teológica mais profunda, e enraizada na fé no Deus do Antigo Testamento. O mesmo é escrito em grego, com um vocabulário elegante e raro, e com o emprego de recursos teóricos diversificados. A utilização desses recursos torna o texto atraente, apresar de austero no trato dos temas. Koninjes e Krull também argumentam que, apesar do texto possuir certa organização (os temas anunciados no começo são retomados no final), a carta não apresenta um plano sistemático.
Quanto à estruturação do conteúdo de Tiago, Carson, Moo e Morris (1997) afirmam que se trata de uma série de homilias sem muito relacionamento umas com as outras, que resiste a uma demarcação estrutural clara. Esses autores dividem o texto em cinco seções: 1-provações e maturidade cristã; 2- o cristianismo verdadeiro visto em suas obras; 3- dissensões dentro da comunidade (poder e perigo da língua; advertência ao cristianismo de concessões); 4- implicações de uma cosmovisão cristã (necessidade de levar Deus em conta em todos os planos que fazemos); 5- exortações finais.
A divisão proposta por Carrez é diferente. Ele estrutura a carta a partir dos capítulos da seguinte forma: cap.1- tema da provação tentação; cap.2 - organizado em torno do tema da fé; cap.3 e 4,1-10 - “não é às obras que se deve opor a fé, mas a uma vida que se contentasse com palavras” (pg.296); cap.4,11 - ao fim - trata do julgamento e da salvação. A divisão proposta por Brown assemelha-se um pouco a esta, porém de modo mais detalhado.
A partir de Kümmel é possível afirmar que as opiniões sobre a origem, o caráter, a época e o valor desta epístola divergem muito. Vejamos esses aspectos gerais do livro.

CONTEXTO AUTORIA

As informações impressas no livro não nos permitem concluir exatamente quem foi o autor, apenas que ele era um homem marcado pela cultura semítica, o que pode ser provado pela presença de expressões figuradas que procedem de tal cultura, como “ir em paz” e “os caminhos do homem”, por exemplo (CARREZ. pg 289); assim como pelas Escrituras judaicas, embora sob a perspectiva de um ambiente helenizado. Kümmel também concorda que o estilo de vida do autor estava de acordo com a tradição judaica e provavelmente se tratava de um cristão judeu. Segundo ele, não há apoio para a hipótese de que o autor tem como cidade de origem/residência a Galiléia. É possível que a epístola tenha sido redigida na Síria. O principal argumento é que a prova mais antiga da existência de Tiago no séc. III foi encontrada na Síria. Poderia ser qualquer lugar onde se encontre o cristianismo oriental. Roma seria o lugar mais improvável.
Em Brown encontramos que a figura apresentada como autor é “Tiago, servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo”. Mas quem seria esse Tiago? Brown levanta algumas possibilidades, como Tiago filho de Zebedeu e Tiago irmão do Senhor. O candidato mais provável é Tiago mencionado entre os ‘irmãos’ de Jesus em Mc 6,3 e Mt13,55, um apóstolo, chefe e porta-voz da Igreja de Jerusalém, após a ressurreição de Jesus, e uma das pessoas mais importantes no cristianismo do NT. Para Brown, o dado mais importante do contexto é a imagem de Tiago como judeu-cristão conservador, leal à observância da lei, mas não um legalista extremado (ficou do lado de Paulo ao declarar que os gentios não precisavam circuncidar-se quando se convertessem - At 15 e Gl 2).
Morris afirma que a ausência de maiores detalhes é forte indício de que se trate de um Tiago bem conhecido.

DATAÇÃO
Encontramos datações diferentes nos autores pesquisados, o que evidencia que não se tem uma datação muito clara da composição dessa obra.
Koninjes e Krull afirmam que a epístola é datada de um tempo não muito distante do de Jesus. Algumas evidências disso são: ela não chega a mencionar a destruição do Templo no ano de 70 d.C.; o ensinamento aí presente é muito semelhante ao que se ensinava na Igreja de Jerusalém por volta dos anos 60 d. C.
Carson, Moo e Morris (1997) levantam 3 possibilidades de datação:
1. Tiago data de aproximadamente início ou meados de 40 d. C. Argumentos: foi possivelmente escrita depois de o ensino de Paulo começar a ter influencia e antes de Paulo e Tiago se encontrarem no Concílio de Jerusalém; não há indício de conflito entre cristãos judeus e gentios (o que seria de se esperar se a carta fosse redigida após o Concílio); a teologia da carta é relativamente pouco desenvolvida. Tomando com base os textos até aqui apresentados, pode-se afirmar que esta hipótese é pouco provável.
2. Início de 60 d. C., caso se tome Tiago, o irmão do Senhor, como autor da obra.
3. Fim do séc. I para aqueles que acreditam que a carta é pseudônima.
Para Carrez, assim como para Kümmel, a data da epístola de Tiago não pode ser determinada precisamente, apenas pode ser situada em fins do primeiro século.

DESTINO/DESTINATÁRIOS
Para Carrez, a carta de Tiago se trata de uma retomada meditada da tradição de algumas palavras de Jesus, porém adaptada para os judeu-cristãos do mundo grego, afim de que estes não perdessem os valores cristãos herdados do judaísmo primitivo através dos ensinamentos de Jesus. Segundo o referido autor, este argumento poderia ser utilizado para explicar a raridade das menções de Jesus.
Para Koninjes e Krull a carta é destinada a judeu-cristãos, provavelmente da Síria (região vizinha à Galiléia), que conservam os costumes do judaísmo. Tratar-se-ia de um público semelhante ao de Jesus, o que justificaria, de certa forma, a aproximação do texto de Tiago com o Sermão da Montanha e com as palavras de Jesus. Tem em comum com os evangelhos a forte insistência na prática.
Quanto ao local de origem da carta, Carson, Moo e Morris afirmam que o contexto social e econômico pressuposto no texto diz respeito aos destinatários e ao autor, e se coaduna com uma procedência palestina. Quanto aos destinatários, para os referidos autores, Tiago está incluído entre as epístolas gerais pois não se dirige a uma igreja específica, embora alguns aspectos da carta evidenciem que a mesma foi endereçada a cristãos judeus que viviam fora da Palestina. Kümmel também apresenta essa compreensão por ser uma epístola católica. Pode-se afirmar que os destinatários seriam um círculo mais amplo de leitores, que não podem ser nitidamente definidos. Trechos como o de 5.1-6 dão a impressão que a maioria dos possíveis leitores era pobre, embora houvesse a menção da presença de ricos (2.1-4 e 4.13-17).
Brown também afirma que há poucos indícios para definir essas questões. O contexto da carta sugere possivelmente Jerusalém ou a Palestina como local de origem. A exortação moral em Tiago é claramente direcionada a uma ou mais comunidades como uma voz contra a cultura dominante com o objetivo de corrigir os cristãos de dentro da igreja.

3 comentários:

  1. Considero importante analisar com afinco esses escritos neotestamentários. Em relação a "carta de Tiago", mais importante ainda, se levarmos em consideração as dificuldades que existem no tocante a definição de datação, autoria, destinatários, dentre outros elementos necessários para uma boa compreensão do texto.
    Creio que os elementos apresentados pela equipe já serão importantes para o nosso trabalho, na tênue missão de interpretar e aplicar o texto para comunidades.

    Parabéns a equipe!

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  2. A equipe esta de parabens! e contribuiu bastanta para o meu aprendizado. as questões apresentadas no tocante a autoria, destinatario e contexto foram otimas e nos posibilitou outros olhares concernente ao texto. fiquei mui feliz

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  3. Olá caros colegas foi muito bom estar com vocês mas um semestre, e esse então foi de muita interação entre o aprendizado da turma,portanto estão de parabêns pelo o conteúdo do blog me ajudou bastante,valeu.
    um abraço!
    genivaldo.

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