sexta-feira, 13 de novembro de 2009

PROPÓSITOS E DESAFIOS PARA HOJE

As escritoras Marilyn Kunz e Catherine Schell afirmam que o propósito da epístola de Tiago não foi evangelização. Apesar de trazer uma nota universal na saudação gentia do versículo um do primeiro capítulo, ela é uma carta pastoral dirigida aos cristãos, cuja preocupação é a de que seus leitores evitem levar uma vida de falsas aparências e hipocrisias. Desperta-os ao fato de estarem comprometidos com Deus, o que significa uma ruptura com o modo de vida mundano. A carta se preocupa com a prática da verdade. Nossa fé tem que produzir obras. Tiago recriminou duramente a quem dizia ter fé, mas não vivia de acordo com ela.
Logo no capítulo primeiro transparece a crença de que os problemas da vida provam a fé da pessoa e que a sabedoria é a habilidade prática para enfrentar a vida e suas provas com atitudes que se harmonizam com a vontade de Deus. Provação aqui se refere a problemas e dificuldades externas que põe a fé em prova. Tentação relaciona-se com os maus desejos do nosso “eu”, que nos atraem para o pecado. E religião refere-se à expressão exterior, ativa e visível da adoração e prática de fé.
O capítulo dois mostra que as atitudes egoístas, pela parcialidade, quebram a lei real (v.8), a saber, a lei da liberdade (v.12) que é cumprir o mandamento de respeitar (v.7,12,13) e amar ao próximo. Aqui Tiago não contradiz o princípio fundamental de Paulo, que o homem só pode ser justificado diante de Deus por meio da fé (compare Rm.3.21-22,28; Gl.2.16). Mas inclui este princípio na sua conclusão lógica: o cristão que tem uma fé verdadeira mostrará com as suas obras a realidade e veracidade dessa fé.
No capítulo três Tiago adverte que os que querem se tornar mestres da fé cristã têm na língua o seu maior poder para edificação e também para destruição. Ele não nos insta ao silêncio e sim a controlar o uso da nossa língua, advertindo para os efeitos práticos desse controle na nossa vida. É necessário haver coerência entre a vida e a palavra do cristão.
O capítulo quatro revela que em vez de terem a paz e a justiça mencionadas no verso 18 do capítulo três, a condição espiritual dos cristãos a quem Tiago escreve é de: contendas, disputas acerca de doutrina, e infidelidade (infiéis, no original = adúlteros, ou seja, desleais para com Deus). A amizade com o “mundo” (ordem de coisas que nos cerca), esse espírito cego para o valor e a realidade das coisas espirituais e permanentes, afeta nossa relação com outras pessoas. Ainda que as paixões humanas motivem a orações e ações erradas, àquele que se humilha, assumindo uma vida dependente de Deus, o Senhor lhe concede graça suficiente para vencer o mal.
A inutilidade da confiança na autonomia e nas riquezas finaliza o quarto capítulo e inicia o quinto. O futuro de todo homem está nas mãos de Deus, o qual é justo juiz que vê o mau uso dos bens, e a exploração e a injustiça impostas aos trabalhadores. A volta iminente desse Senhor e Juiz faz urgir atitude de fé atuante, na prática da justiça e da perseverança. A essência do mal e do pecado é o egoísmo e a omissão, onde o objetivo da riqueza tira o lugar de Deus e do próximo (4.13-17). Os oprimidos não devem perder a fé, mas perseverar na expressão prática da fé, o amor, que ainda é o melhor caminho. A fé cristã é um modo de viver que envolve todos os aspectos da vida, onde o amor deve se expressar na comunhão, na oração, no louvor, no perdão, na confissão e na conversão.
A epístola de Tiago é de conteúdo universal, que desafia o cristão, até aos dias de hoje, a cumprir os seus propósitos, os quais são atuais: ter uma vida controlada pela Palavra de Deus, para libertar-se do domínio e escravidão do pecado, para uma cosmovisão e prática saudáveis.
Segundo Coelho Filho, o grande desafio de Tiago é que tenhamos uma compreensão do mundo segundo a ética de Deus. Tiago reinterpretou a Lei mosaica em sentido de responsabilidade pessoal e de liberdade. A Lei se torna Lei de liberdade para quem a cumpre verdadeiramente.
Para o que se contenta em ouvi-la sem cumprir, ela é instrumento de condenação. As obras da Lei têm sempre algo a ver com o respeito e o amor ao próximo. Há uma equivalência entre a lei e o irmão. A Lei do Reino, lei real, consiste no amar ao próximo como a si mesmo (2.8). O nexo entre lei e amor de caridade transforma a lei escravizante em lei de liberdade. A preocupação com a busca de uma vida reta diante de Deus como sendo a maior necessidade do cristão, mostra que buscar felicidade e satisfação sem uma vida correta e sem santidade é uma armadilha.
Outra relevância de Tiago é sua exortação para praticarmos a fé, e não apenas a acalentarmos. Cristianismo não é apenas sentimentos e liturgia. É uma entrega a Cristo e, consequentemente, uma cosmovisão crítica, um estilo de vida à luz da Palavra de Deus. O grande desafio de Tiago é: “E sede cumpridores da palavra, e não somente ouvintes” (1.22).
É compreensível, apesar de injustificável, que, preocupado em afirmar a doutrina da salvação pela graça, por meio da fé (uma necessidade urgente em época de venda de caras indulgências), o reformador Lutero não se entusiasmasse com a epístola que não trata de assuntos como salvação e vida eterna. A epístola não se preocupa com ensinos teológicos ou doutrinários. Mas apesar dessas omissões, Tiago é de extrema importância para os cristãos de hoje, pois se preocupa com assuntos relevantes para a igreja. O maior de todos os antagonistas do evangelho está dentro da igreja: o evangelho não vivido – cristãos que não vivem sua fé e dão mau testemunho. Tiago trata da conduta correta, do bom uso das palavras, da honestidade no trato e integridade de caráter.
A nova vida em Cristo nos coloca diante de uma nova proposta de vida que deve, sem se preocupar com a ênfase das igrejas em espiritualizar em demasia a fé cristã, propor não só promessas, mas exortações e correções que sanarão muitos problemas em nosso meio. Caminhando pela epístola de Tiago é fácil perceber os erros que foram cometidos, analisando o que deve ser mudado em nossa vida, para benefício de várias áreas da existência nossa e do nosso próximo.









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